Primeiro capítulo de “O Rico e Lázaro” estabelece novo padrão para novelas bíblicas

Esqueça tudo que você já viu em termos de novelas e minisséries bíblicas. Esqueça até as maravilhosas cenas de “Os Dez Mandamentos”. Tudo isso foi ultrapassado ontem com a estreia da nova novela da Record “O Rico e Lázaro”.

A primeira novela brasileira gravada em 4K, o “Rico e Lázaro” não se destaca somente por esse salto na qualidade da imagem. A direção é cinematográfica, com tomadas pouco usuais em novelas. Resta aguardar para ver se será uma característica somente do primeiro capítulo, como é comum nas novelas globais, ou se será uma marca da novela inteira.

Para a realização da novela, a Record ergueu uma cidade cenográfica de 15 mil m², com parte de Jerusalém e da Babilônia, incluindo canais navegáveis nessa última. E os efeitos de computação gráfica são ainda mais impressionantes do que os vistos em “Os Dez Mandamentos”.

Para quem não estava entendendo como uma novela com o título tirado de uma parábola dita por Jesus no Novo Testamento poderia se passar no Velho Testamento, o começo do capítulo já explicou a solução encontrada pela autora. O capítulo começa no Inferno, onde um homem nu (algo realmente inesperado numa novela bíblica) corre desesperado. Essa cena, guardada as devidas proporções, lembra muito o começo do filme “Nosso Lar”. Quem conhece a parábola já sabe que essa é a alma do homem rico, mas a autora quer fazer um suspense não deixando que saibamos qual dos dois personagens principais será o rico e qual se tornará Lázaro. Por isso, não vemos o rosto desse homem em desespero em momento algum. De repente, ele vê a alma de Abraão, patriarca do povo judeu, ao lado de outra alma – que igualmente não vemos o rosto – e faz o clássico pedido para que o pai Abraão mande que Lázaro molhe seus dedos e toque a boca do homem atormentado. Após a negativa de Abraão, a cena recua no tempo para 600 a.C. onde dois adolescentes brincam. Já sabemos que um deles será o rico e outro o mendigo Lázaro, mas qual deles não se sabe. Eu tenho minha aposta.

As interpretações, inclusive dos adolescentes, estão muito boas, fugindo da teatralidade. É uma felicidade ver o ator Vitor Hugo, no papel do profeta Jeremias. Vitor Hugo é um ator que aprendi a admirar à medida que fui assistindo novelas e séries em que ele trabalhou. Ele consegue dar credibilidade tanto a vilôes como a mocinhos, coisa rara nos atores atuais. Seu Jeremias é um homem atormentado pela missão que Deus lhe confiou: alertar o povo hebreu do Reino de Judá para se arrepender de seus pecados, caso contrário uma grande desgraça se abaterá sobre eles. Por 25 anos Jeremias pregou e ninguém lhe deu ouvidos. O sofrimento diante da consciência do resultado da iniquidade o faz parecido com Cassandra, que previu a queda de Tróia. Seus alertas só atraem inimigos e até pedradas.

A trilha sonora fica a cargo do grande Daniel Figueiredo, que assinou a trilha de “Os Dez Mandamentos” e “Terra Prometida”. Já na abertura, vemos uma característica do trabalho de Daniel, com um tema de abertura que, já na segunda vez que o ouvimos, nos faz gravar na memória.

O figurino é irrepreensível, com a simplicidade habitual do povo hebreu, contrastando com a opulência dos hebreus mais ricos ou dos sacerdotes. Mas é na Babilônia é que encontramos o verdadeiro fausto em termos de roupas e adereços, ultrapassando até aquele visto no Egito de “Os Dez Mandamentos”.

Por falar em Egito, um ponto negativo foi ver que o diretor cedeu às teorias africanistas e sem fundamento histórico de que os egípcios eram negros. Ao contrário de “Os Dez Mandamentos” onde a sociedade egípcia tinha pessoas de diveras etnias, como se acredita ter sido o Egito antigo (realmente tivemos faraós negros da Núbia, porém somente num período específico), a cena onde Nabucodonossor derrota o faraó Necho, todos os egípcios eram atores e figurantes negros, uma inveracidade histórica.

A novela terá 150 capítulos, caso a Record não mande esticar como é de seu feitio. A autora, Paula Richard, é uma estreante como autora principal, mas já colaborou com várias novelas e minisséries, inclusive com “Os Dez Mandamentos”. Esperamos que ela se saia melhor do que o autor de “Terra Prometida” que escreveu uma enorme barriga em forma de novela. Richard pretende terminar de escrever totalmente a novela já no segundo mês, o que é um feito impressionante. Gravar uma novela já quase totalmente escrita evita aquelas mudanças absurdas de comportamento de personagens que vemos por aí.

Esperamos que a novela realmente mantenha o nível de qualidade do primeiro capítulo, o que seria uma garantia de sucesso.

Se quiser saber mais do contexto histórico da época em que se passa a novela, leia esse artigo.

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