Após a segunda semana de “O Rico e Lázaro”, a nova novela bíblica da Record, os sites de notícias alardearam, com um prazer sórdido, que a audiência de estréia foi “decepcionante”.
Na verdade, os dados para afirmar isso precisam ser melhor analisados. A comparação entre a audiência de estréia da nova novela (13,7 pontos) com a mesma audiência de estréia de “Terra Prometida” (15,3 pontos) precisa ser relativizada e compreendida. O imenso sucesso de “Os Dez Mandamentos” praticamente estendeu um tapete vermelho para a estréia de “Terra Prometida”. Por outro lado, o final morno desta última novela, que foi bastante fraca, atrapalhou a estréia de “O Rico e Lázaro”. E só 1,6 pontos de queda numa atração que ainda é a líder de audiência da emissora pode ser chamado de fracasso?
A Record cometeu um erro imenso ao não reprisar o capítulo de estréia na terça-feira. Teria sido estratégico repetir o capítulo no horário de “Escrava Isaura”, que já é uma reprise e não faria falta, antes de exibir o segundo capítulo. Outra opção seria passar um compacto no sábado, dia em que a Record não exibe novelas. Quem perdeu o começo e desejasse acompanhar, poderia entender melhor a trama.
Mas as perspectivas são positivas. Acredito que, tal qual ocorreu com “Os Dez Mandamentos”, a qualidade da novela irá atrair mais e mais expectadores. E por que tenho essa impressão?
Inicialmente a trama. A estreante Paula Richard surpreendeu com um enredo que, apesar de complexo e com um grande número de personagens, não se tornou confuso. A autora foi muito corajosa ao optar por nomes que, a princípio, poderiam assustar o público, tais como Nebuzaradã, Sammu-Ramat, Nitócris, Beroso, Rabe-Sáris, Evil-Merodaque, Nabonido ou Hurzabum. Porém, com uma associação de um enredo bem escrito, onde esses nomes são repetidos de forma a serem decorados pelo público e uma direção inteligente, que inseriu nas cenas dos capítulos anteriores o nome de alguns personagens, estes nomes vão ficando mais familiares a cada capítulo.
E essa opção por nomes autênticos também ocorreu em “Os Dez Mandamentos”. Basta lembrar que a mãe adotiva de Moisés chamava-se Henutmire e o público logo se acostumou com o nome incomum.
Já que falamos em direção, essas duas primeiras semanas deixaram claro que a direção cinematográfica do capítulo de estréia não se resumirá ao primeiro capítulo. A direção de Edgard Miranda tem sido de uma qualidade excepcional. Sem contar a cenografia e figurino impecáveis, com uma fidelidade histórica acima da média para novelas. Computação gráfica e trilha sonora acrescentam qualidade ao produto final.
Mas tudo isso seria um desperdício se o elenco não correspondesse à altura. E o elenco de “O Rico e Lázaro” está afinadíssimo como uma orquestra. Como ainda estamos na primeira fase da novela, quando parte dos personagens ainda é criança ou adolescente, temos um número anormalmente alto de atores infanto-juvenis, o que poderia garantir momentos constrangedores devido a atuações fracas e pouco naturais. Porém a direção desses jovens está de parabéns, pois todos passam muita naturalidade.
Como destaque do elenco jovem temos Maitê Padilha, no papel de Joana, chegando a nos fazer esquecer que ela não será a titular do papel, que será interpretado por Milena Toscano na segunda fase. Outro destaque é Rafael Gevú, no papel de Asher, um garoto que consegue passar emoções de cenas intensas somente com o olhar. É uma pena que jovens tão talentosos já deverão sair da trama em breve, quando houver o salto de tempo para a segunda fase.
No time dos adultos, os destaques são para Heitor Martinez, que faz um Nabucodonossor extremamente humano e real, sem maniqueísmos; Leonardo Medeiros, cuja curta participação como o Rei Eliaquim de Judá conseguiu passar toda a fraqueza de um rei indigno de se sentar no trono que pertenceu a Davi; Adriana Garambone repete sua ótima atuação de “Os Dez Mandamentos”, dessa vez personificando Amitis, rainha da Babilônia; Lucinha Lins num papel aparentemente simples, mas com grande exigência interpretativa, como Zelma a serva fiel a Deus numa família de idólatras. Mas sem dúvida, os primeiros capítulos pertenceram a Vitor Hugo, um Jeremias atormenta com o futuro que não consegue evitar. Acompanhei esse ator em praticamente todas as séries e novelas bíblicas da Record e pude constatar sua ascensão de papéis menores até essa participação especial, reconhecimento mais do que justo ao seu talento.
Também devemos considerar que, na segunda fase, os jovens e crianças serão substituídos por atores adultos mais conhecidos, o que irá atrair mais público.
Por esses motivos, acredito que a Record não deve se preocupar com os indíces de audiência iniciais. Essa novela ainda deverá ter uma ascensão de público como ocorreu com “Os Dez Mandamentos” e ter o reconhecimento merecido.