O filme de Josias Teófilo se mostra não só necessário, como indispensável para apresentar Olavo ao grande público e melhor compreender o filósofo.
Olavo de Carvalho é uma dessas raras pessoas que consegue que ninguém fique indiferente a ela: ou se ama ou se odeia. Talvez por isso, tudo que diga respeito a ele sempre seja acompanhado de uma grande carga de emoção. As redes sociais estão repletas de pessoas que o defendem de forma irrestrita, os “olavetes”, assim como outras pessoas que parecem ter assumido uma cruzada contra Olavo. E isso somente dentro dos grupos da assim chamada Direita.
Porque a Esquerda, essa há muito decidiu praticar com o Olavo a mesma tática que foi feita com Wilson Simonal, a morte em vida. Com raríssimas exceções, a Esquerda não toca no nome de Olavo de Carvalho ou comenta seriamente suas ideias. Até há alguns anos, a tática era outra. Sempre que se falava de Olavo, era em tom de piada, como o “filósofo que não é formado em filosofia” ou como “astrólogo”. Mas essa tática se mostrou totalmente inútil e a opção pela morte em vida foi escolhida mais recentemente. Fingem que Olavo não existe.
Por isso, a realização de um filme sobre o filósofo incomodou tanto a Esquerda. Como fizeram um filme sobre alguém que não existe? Ou que não é importante? O diretor Josias Teófilo foi execrado por seus colegas cineastas pernambucanos, como se a confecção de um filme sobre uma figura que, sozinha, já cria tanta polêmica, não fosse por si só justificável. Um crítico declarou sua dúvida se o filme podia ser chamado de documentário. Já outro duvidou que Olavo teria real todos os livros sobre comunismo que ele mostrou.
O filme “O Jardim das Aflições”, que tem produção de Matheus Bazzo, é um documentário que, utilizando da estrutura e conteúdo do livro homônimo, se propõe a apresentar o autor Olavo de Carvalho. Mas também é um documentário que, narrando alguns dados biográficos de Olavo, discute o conteúdo filosófico do livro. Como Josias conseguiu fazer as duas coisas ao mesmo tempo, só assistindo ao filme.
Um dos primeiros pontos que chama a atenção do espectador é a beleza extraordinária da fotografia de Daniel Aragão. Para que um documentário precisa ser tão plasticamente belo? Só descobrimos o motivo quando vamos nos aprofundando no enredo. A fotografia é parte indispensável para deixar o espectador receptivo para as ideias que Olavo irá exprimir.
Outro ponto que particularmente me surpreendeu é a didática excepcional de Olavo de Carvalho. Conceitos extremamente profundos se tornam simples com sua explicação. Tudo dito como se estivéssemos conversando sobre futebol ou algum outro assunto de fácil compreensão, mas estamos ouvindo conceitos de Ortega y Gasset, Eric Voegelin, Aristóteles, etc.
“Então deve ser um filme maçante”. Aí que você se engana! Todos no cinema se surpreenderam quando o filme acabou. Poderíamos ficar ali mais uma hora tranquilamente. O filme passa de forma tão suave e agradável que termina deixando uma vontade de se inscrever no COF, o curso de filosofia que Olavo ministra há anos pelo YouTube.
A alternância de cenas onde se discute temas complexos com outras do cotidiano do filósofo, nos dá a impressão de que invadimos sem convite a sua intimidade. Constrangidos, optamos por ouvi-lo em silêncio respeitoso, embora esse silêncio seja interrompido algumas vezes por risadas. Sim, Olavo é uma pessoa engraçada. É possível ser filósofo sem ser pedante. É possível ser filósofo sem falar da maneira empolada como alguns o fazem. E é possível ensinar filosofia sem dar sono.
Mas o filme também fala de política, mostrando inclusive entrevistas antigas de Olavo onde ele afirmava coisas que, na época, eram tidas como absurdas e hoje sabemos que realmente ocorreram. Essa capacidade de prever algumas coisas deu origem ao mantra dos olavetes: “Olavo tem razão”.
Quem espera encontrar aquele senhor do Facebook, falando palavrões e entrando em discussões com várias pessoas irá se decepcionar. Após esse filme, conclui que esse Olavo que vemos nas redes sociais é um personagem do Olavo de Carvalho filósofo e jornalista. Ele mesmo brinca com sua capacidade de atrair loucos. O verdadeiro Olavo é muito mais profundo.
Uma das ofensas feitas ao documentário foi que ele seria um filme que não deveria existir. Após assisti-lo, concluo exatamente o contrário. Sabendo da alergia à leitura que os brasileiros têm, se esse filme não tivesse sido feito, quando Olavo morresse, talvez tudo que se dissesse sobre ele seria sobre o “Olavo do Facebook”. Agora isso não é mais possível.
E para o crítico que teve dúvidas se esse filme poderia se chamar um documentário e para o outro que teve dúvidas se ele realmente leu todos aqueles livros, é totalmente compreensivo que, acostumados com os Cortella, Karnal e Barros da vida, haja uma certa dificuldade para se compreender um verdadeiro erudito. Isso foge à capacidade dessas pessoas. Quem sabe, se assistirem mais algumas vezes seus cérebros consigam compreender a mensagem.