Faltando um ano e meio para as eleições presidenciais de 2018, duas atividades principais têm se destacado no meio político: a campanha precoce de Lula e a briga entre os partidários de Jair Bolsonaro e João Doria.
Antes de mais nada, uma declaração pessoal. Não sou nenhum bolsonete, mas também não sou nenhum opositor a Jair Messias, inclusive votei em Eduardo Bolsonaro nas últimas eleições gerais. Não tive oportunidade de votar em Doria porque já tinha transferido meu título para São Vicente, mas teria votado nele.
Após essa declaração, me sinto confortável para me posicionar em relação à guerra iniciada entre os apoiadores de Doria e Bolsonaro. Sigo ambos os políticos e não vi nada vindo deles, só de seus seguidores. Ou seja, é briga de fãs ou de torcidas organizadas, sem qualquer relação com os personagens principais.
Tudo começou quando Doria fez algo impensável no mundo da política: começou a fazer o que havia prometido na campanha e começou a agir como seus eleitores gostariam que ele agisse. A Esquerda e parte da imprensa, que muitas vezes se confundem uma com a outra, começaram a criticar porque ele “governava só para seus eleitores”, o que é uma bobagem já que Haddad implantou ciclovias por tudo quanto é rua da cidade, o que não era pauta nem de quem não votou nele, nem mesmo de todos os seus eleitores, só de uma parcela. Governou para meia dúzia de cicloativistas.
O combate às pichações, que deveria ser aplaudido pelos conservadores, parece que foi o estopim da divisão da Direita. A imprensa esquerdista fez tanto alarde criticando as ações de Doria que pessoas de diversas partes do país começaram a comentar que gostariam de um prefeito assim. Terrível erro! Isso despertou suspeitas de que Dória teria ambições maiores do que a Prefeitura. Até mesmo alas do PSDB começaram a ver essa opção como a mais forte para chegar ao Planalto.
Quando falo “alas do PSDB” é porque Doria é tudo menos um consenso nesse partido. Aliás, o que é consenso no PSDB? Um partido onde temos desde socialista clássicos, social-democratas, liberais e até conservadores. Doria é mal visto pelos setores mais à esquerda, como o ex-presidente Fernando Henrique Cardoso.
Porém, essa eventual e ainda virtual candidatura de Doria despertou a ira de outro grupo, no outro lado do espectro político. Os apoiadores de Jair Bolsonaro viram nessa possibilidade um risco para as chances de seu preferido e começaram uma campanha de ataques a Doria como aliás não se via nem em relação a Luciana Genro, Marina Silva ou Ciro Gomes.
Os ataques foram tanto a Doria quanto aos seus apoiadores. Uma das críticas foi que os liberais apoiam Doria e sempre criticaram o excesso de admiração dos bolsonarianos em relação ao “mito”. Essa crítica me parece injusta. Nunca vi ninguém apoiando Doria ANTES dele começar a tomar uma série de medidas interessantes. Os apoiadores de Bolsonaro o admiram pelo que ele fará. Os de Doria admiram pelo que ele já fez.
Aliás, se formos falar de o que Bolsonaro já fez, fica mais complicado ainda. Afinal, em diversas votações, Bolsonaro se alinhou muito mais com a Esquerda do que com valores da Direita. Porém, o que vejo é que, enquanto medidas aparentemente erradas de Doria são alvo de críticas dos liberais (indicação de Soninha Francine, ideia de proibir venda de tinta para pichações), os defensores de Bolsonaro sempre encontram uma justificativa para a atuação dele. Isso é preocupante pois, se ele sofresse pressão de seus eleitores quando votasse de forma contrária ao esperado, poderia ir formando um padrão de comportamento muito mais próximo do ideal.
É essa defesa apaixonada dos bolsonarianos que pode vir a afastar mais e mais direitistas, não só os liberais. Como no caso recente da PEC que permitiria a cobrança de cursos de pós-graduação lato sensu pelas universidades públicas. De uma hora para outra vimos uma série de direitistas repetindo chavões do Movimento Passe Livre e afirmando que a universidade pública tem que ser gratuita porque é um direito previsto na Constituição e já pagamos por isso com nossos impostos.
Nunca soube que nossos impostos serviam para pagar curso de pós-graduação de Ciências Sociais para neguinho escrever sobre sexo gay em banheiros públicos (acredite, existe esse tema). Os cursos Lato Sensu geralmente já eram pagos, e eram eles que mantinham várias universidades federais bem estruturadas. Principalmente no Sul do país. Agora, essa cobrança será proibida. Restará às universidades fechar os cursos, pois não têm verba nem para os cursos de graduação e pós-graduação estricto sensu. E a verba que vinha desses cursos e que permitia reformas de prédios e melhoramentos vai acabar.
“Ain, vocês estão querendo que o contribuinte pague duas vezes pelo mesmo serviço!”
Para começar, ninguém paga imposto para fazer pós-graduação. Segundo que, direito por direito, o de transporte público é muito mais fundamental e sempre se ouviu essas mesmas pessoas atacarem o Movimento Passe Livre por querer transporte gratuito. A verdade é que, para defender seu político favorito, essas pessoas fazem malabarismos semânticos e de raciocínio, quando seria muito mais simples dizer “Meu candidato deu uma pisada na bola nesse caso particular, mas ainda o considero melhor opção”. Gente, qual o mal disso?? Para que você precisa violentar a sua consciência e criar todo um raciocínio torto para não dizer que foi uma falha? Será que, se você admitir isso, correrá o risco de admitir outras falhas e acabar perdendo a admiração? Será que tudo isso é medo de não ter mais um mito para adorar?
Pior ainda. Desafio qualquer um desses defensores de Bolsonaro a me mostrar uma postagem anterior a um mês atrás em que ele defendesse a universidade pública e gratuita pois “já pagamos impostos”. Aposto que todos eram contra as universidades públicas e gratuitas até que tiveram que criar um novo discurso para justificar Bolsonaro ter votado junto com partidos de extrema-esquerda. Aliás, esses votos de Bolsonaro em conjunto com partidos de extrema-esquerda é que faz muitos liberais não acreditarem nos ideais liberais que ele diz que passou a defender.
Mas voltemos a Doria. Para desmerecer o atual Prefeito de São Paulo, os defensores de Bolsonaro apelaram para duas frentes: chamá-lo de socialista fabiano por estar no PSDB e afirmarem que o marketing da Esquerda é que está impulsionando a popularidade do prefeito. Qualquer pessoa que já tenha visto como a imprensa esquerdista persegue Doria poderá constatar que ela quer tudo menos Doria presidente.
Agora, quanto a ser socialista fabiano por estar no PSDB, veja esse comentário de um político tucano.
“Muita gente me questiona por eu defender valores da direita e fazer parte do PSDB. Isso é decorrente de peculiaridades da realidade partidária brasileira. O PSDB me ouve e garante total liberdade para fazer o meu trabalho conforme o que eu penso. Só para ilustrar, o Bolsonaro era do PP -partido que era sócio do PT- e hoje é do PSC, que por doze anos foi base dos governos petistas. Mesmo assim, Jair faz o trabalho que vocês admiram. Ou seja, não avaliem pela sigla, avaliem pela postura. Politica real é algo bem mais complexo do que procurar uma turma que ande com camisetas ou bonés da mesma cor.” Paulo Eduardo Martins, Deputado Federal.
Isso também foi tema de Flávio Morgenstern, que nos lembra que Doria chama Lula de bandido, desfaz petismo, briga com a imprensa e ganha. “Se você ainda não se tocou que Doria é um ANTI-TUCANO, tarde demais.” afirma Morgenstern e nos lembra que o próprio Olavo de Carvalho há anos fala para se tomar um partido pronto e usar toda a sua estrutura a seu favor. Julgar Doria pelo seu partido seria o mesmo que julgar Bolsonaro pelo PP, partido onde passou os últimos anos e que é ainda mais corrupto que o PT.
No final das contas, se ambos concorrerem à Presidência, é capaz de Bolsonarianos não votarem em Doria e liberais não votarem em Bolsonaro, nem mesmo no segundo turno, pelos MESMOS motivos: por não acreditarem que o candidato realmente seja de direita. E elegerão, de forma indireta um candidato que será abertamente de esquerda.