A tendência sempre que criticamos uma novela é ouvir a seguinte pergunta: “Mas por que você assiste novela? Por que você assiste TV aberta?” Essa resposta, além de extremamente elitista, mostra um desconhecimento da importância da TV aberta e, particularmente, das novelas para a formação da (in)consciência da população brasileira. A imensa maioria da população ainda não tem acesso a TV paga e, mesmo a que tem, ainda assiste muito da programação aberta. Então, conhecer o conteúdo dessa programação, mesmo que sem seguir nenhuma novela, é importante para conhecer o que estão tentando passar para a população brasileira.
A crítica que farei não é nova. Já vem sendo mencionada, de forma um pouco tímida, por alguns críticos de TV, talvez receosos de serem eleitos como retrógrados pelos formadores de opinião. Já na novela “Sete Vidas”, de Lícia Manzo, houve algumas críticas ao fato de praticamente todos os personagens masculinos da trama serem extremamente fracos se comparados aos personagens femininos. Na verdade, essa autora já havia, em trabalhos anteriores, mostrado essa tendência, mas em “Sete Vidas” a coisa chegou ao ápice, com o protagonista masculino não passando de um doador de esperma que, incapaz de lidar com a perda de sua mulher (afinal, homem se substitui, mas mulher é insubstituível), foge de tudo e de todos. Os outros personagens masculinos eram de indecisos a bananas completos, tão desprovidos de masculinidade a ponto de dois deles, no final, acabarem abandonando seus casamentos e se revelando homossexuais, iniciarem relacionamento.
Se esse tipo de enredo se limitasse às novelas da referida autora, não haveria nenhum problema. Afinal, cada autor imprime às suas obras sua forma de ver o mundo e ela vê o mundo com visão de uma Mãe Terra, feminina e gestante, que é representada pelas mulheres, cabendo aos homens a única função que ainda lhes cabe: fecundar as mulheres. Isso é válido.
Porém, isso está se tornando mais amplo. Se, na novelinha “Malhação”, tínhamos inicialmente personagens masculinos que atuavam de forma decisiva na resolução das tramas, hoje os protagonistas masculinos são manipulados, indecisos entre uma mocinha e uma manipuladora, que até pode se associar a um personagem masculino que faz o vilão, mas geralmente o manipula também. Isso tudo em meio a discursos politicamente corretos que, junto à faixa etária que assiste “Malhação”, tem um efeito doutrinador tremendo.
E não é de se espantar que o primeiro trabalho da dupla Rosane Svartman e Paulo Halm fora de “Malhação” mostre esse mesmo modo de pensar (ou de doutrinar). Trata-se de “Totalmente Demais”. Nessa novela, o processo de mostrar um homem banana como sendo algo correto, ou pelo menos normal, é mostrado em vários níveis. A começar pelo personagem do Jhonatas, um antigo vendedor de balas em semáforo, que subitamente é contratado para ser office-boy de uma grande empresa de cosméticos (que não deve ter um bom setor de Recrutamento e Seleção em seu RH). Apesar de cenas absurdas, como aquela em que ele dá conselhos de marketing numa reunião de diretoria (qualquer pessoa que já trabalhou numa empresa de média para grande sabe com que “abertura” se dá ouvidos a funcionários de nível intermediário, imagine a um office-boy), o personagem é um dos muitos bananas da novela, correndo o tempo todo atrás de Eliza, uma menina excessivamente bonita para ele (por que não escolheram um ator mais bonito?) e atrapalhando os planos da garota de ganhar o concurso e ajudar sua mãe.
Outro banana da trama é do dono da empresa de cosméticos. Obviamente que os autores não poderiam pensar num homem rico que se casasse com uma mulher pobre (algo muito mais comum). Germano é um homem de origem humilde que se casou com a herdeira ricaça. Isso cria uma situação de dependência muito clara, como ocorreu quando Germano descobriu que seu filho, Fabinho, havia roubado dinheiro da empresa para incriminar Jhonatas. Germano, corretamente, não queria permitir a volta do filho à empresa. A esposa, que parece ser a responsável pelos dois filhos não prestarem, demite o próprio marido da empresa para manter o filho ladrão. Mas a coisa fica ainda mais absurda quando a esposa vê um vídeo onde o marido dança inocentemente com Carolina e o expulsa de casa, para logo em seguida dar um amassos no ex-namorado da filha falecida, que tem idade para ser seu filho. Ou seja, Germano é punido por uma infidelidade que não ocorreu, enquanto a esposa é infiel, mas a novela não chama atenção para a injustiça da coisa e Germano ainda mantém uma devoção a ex-esposa a ponto de querer ter uma foto dela na sua mesa de trabalho.
Porém de todos os bananas, o pior é Arthur, personagem de Fábio Assunção. A novela inteira ouvimos pessoas falar que ele seria um cafajeste mulherengo, mas nunca vemos isso. O que vemos é um homem sensível, que lê poemas (quem diria que ainda chegaríamos ao ponto de ver um cafajeste amante de poesia) e é totalmente apaixonado por Carolina (Juliana Paes, a cada dia se firmando mais como uma grande atriz). Aliás, novamente, vemos o homem ser punido por uma infidelidade que não ocorreu, quando a própria Carolina, desesperada por uma gravidez, até tentou ir para a cama com o amigo gay, sem que isso fosse visto como algo errado. Cena após cena, ouvimos Arthur afirmar que gosta de ser humilhado por Carolina, que gosta dela por esse temperamento agressivo, ou seja, as características masculinas (e que são criticadas nos homens) se tornam atrativas nas mulheres.
A coisa chegou a ponto de Carolina exigir que Arthur fingisse ser um cachorro em vídeo enviado via celular. Para surpresa de Arthur, Carolina posta o vídeo na internet, causando uma humilhação pública e, quem sabe, até atrapalhando os negócios dele. Qual a reação dele? Fica furioso, indignado ou humilhado? Não! Acha graça e afirma que gosta de pagar mico por ela…
Mais recentemente, o pai de Arthur vai procurar Carolina, tentando fazer com que ela desistisse da aposta feita com Arthur onde um apostou a sua própria empresa. Carolina afirma que, se ganhar, manterá Arthur como seu empregado, com um salário bem menor do que o atual. Ao ouvir isso do pai, Arthur responde que é por isso que ele ama essa mulher. Prêmio Banana do Ano.
Como já disse, não haveria nenhum problema se esse tipo de enredo fosse alternado com outros, onde os personagens masculinos fossem mais fortes, porém não é o que temos visto. Isso é uma tendência para todos os enredos. Ou o personagem masculino é um total crápula, como o padrasto abusador de Eliza ou um safado como Florisval, que não quer casar com sua namorada e insiste em tentar algo com sua ex-mulher, ou é um banana completo. Prestem atenção nos enredos para conferir.