O Brasil é um dos campeões de uso de calmantes e medicamentos para dormir. Porém, com a descoberta recente de que medicamentos calmantes, os populares “faixa preta”, estão relacionados entre responsáveis pela Doença de Alzheimer, muitas pessoas estão preocupadas com medo de utilizar a medicação ou, se não utilizar, não conseguir dormir.
Antes de mais nada, precisamos compreender que o ser humano é o único animal que tem insônia. Por que? Porque é o único que acredita que pode não ser capaz de dormir sem ajuda de medicamentos. O sono é uma função fisiológica, portanto faz parte normal das atividades do corpo humano. Existe somente uma doença física em que a pessoa não consegue realmente dormir, a Insônia Familiar Fatal, uma doença raríssima e que evolui para deterioração mental e morte. Portanto, uma pessoa que tem insônia há 20 anos não tem nenhuma doença física. Ou se trata de uma doença mental ou de dependência psicológica ou física de medicamentos para dormir, muitas vezes iniciados de forma errada, em situações onde não se deveria utilizar.
Culpar os médicos pela prescrição desenfreada de calmantes é pensar somente num dos lados da questão. É frequente que o paciente não aceite a recusa do médico, procurando por outros até que consiga a prescrição do calmante desejado. Também não é raro que a pessoa procure o médico já viciada no calmante, emprestado por algum familiar ou vizinho antes mesmo da primeira consulta. O paciente já informa que “não pode ficar” sem o calmante, transferindo a responsabilidade para o médico.
Isso não quer dizer que remédios para dormir não tenham sua indicação precisa. Pessoas que trabalham em turnos, podem ter dificuldade para dormir, já que cada dia dormem num horário diferente. Mudanças de fuso horário, o famoso jetlag, também levam a dificuldade para dormir. Algumas doenças físicas podem levar a dificuldade para dormir, seja por dor, seja por alterações de liberação de substâncias que propiciam o sono, como se vê em distúrbios da tireóide.
Porém, a imensa maioria das pessoas que afirmam ter insônia, não têm indicação de uso de qualquer medicação para dormir. Vamos analisar algumas situações.
A insônia que não é
Uma parte importante das pessoas que dizem que têm insônia, na verdade não tem. A necessidade fisiológica de sono diminui com a idade. Uma pessoas de 70 anos pode necessitar somente de 5 horas de sono por dia. Se, no dia seguinte, ela não estiver sonolenta, é sinal de que teve o número ideal de horas de sono e não deve tomar medicação nenhuma.
“Ah, mas o que essa pessoa idosa fará no tempo que deveria estar dormindo?” Esse é o grande problema! Se a pessoa não gosta de ler, não gosta de filmes, não gosta de música, não é religiosa, realmente sobra muito pouca coisa a fazer. No passado, a idosa, quando começava a diminuir as horas de sono, ia para a missa das 5 da manhã ou abria seu missal e ficava rezando o terço. Hoje nenhum padre celebra missa a essa hora e ninguém mais reza. Não é raro nos depararmos com idosos que, após a aposentadoria, não fizeram mais nada na vida, já que nunca cultivaram o hábito da leitura, nunca tiveram um hobby ou algo que preenchesse suas horas vagas.
Também é comum pessoas reclamarem que não dormem nada, mas o cônjuge afirme que a pessoa chega a roncar à noite. Se essas pessoas tiverem seu sono monitorado, constata-se que elas realmente dormem. Por algum motivo a pessoa não tem consciência disso ou simplesmente quer crer que não consegue dormir.
A insônia antecipatória
Tem um compromisso amanhã? Um problema a resolver? Uma prova? Dívidas? Se você fica a noite toda pensando no que vai acontecer, isso é insônia por ansiedade antecipatória.
Algumas técnicas simples podem ajudar. A primeira é racional. Você já deve ter notado que, na maioria das vezes, quando você chega no dia seguinte, constata que o problema não era tão grande assim e que a solução apareceu. Perdeu uma noite de sono à toa. Então, da próxima vez, lembre-se disso e procure tirar a preocupação da cabeça, consciente que o problema pode não ser tão grande assim no dia seguinte. Além do mais, uma boa noite de sono é uma ótima conselheira.
Outra técnica para esse tipo de insônia é a Mentalização de soluções. Pense naquilo que você deseja e precisa para solucionar o problema em questão. Deixe de lado a culpa e a autopiedade. Defina seu objetivo em detalhes de como resolver a situação e mantenha-a em mente. Planeje hora e local para discutir a solução com as pessoas envolvidas. Mentalmente descreva seus sentimentos, como se estivesse falando para as pessoas necessárias para resolver o problema. Terminado isso, tenha a certeza de que os problemas serão resolvidos na sua hora certa.
A insônia por tensão
A correria do dia-a-dia, muitas vezes, nos deixa tensos. E, depois de horas de tensão, simplesmente esquecemos como relaxar. Não se trata de relaxamento mental, mas físico. Ninguém dorme se estiver com os músculos todos contraídos. Uma das causas desse tipo de insônia é a tendência, nos últimos tempos, de transformarmos nossa cama em centrais de entretenimento e praça de alimentação. É muito difícil para nosso corpo saber que ao deitar na mesma cama onde nos alimentamos, vemos TV, jogamos videgames de ação, assistimos filmes de terror ou lemos livros que prendem nossa atenção, dessa vez queremos dormir! Nosso corpo ficou tenso durante todas essas atividades e tende a permanecer tenso mesmo quando queremos dormir.
Para lidar com esse tipo de insônia, devemos utilizar a técnica do relaxamento progressivo. Existem outras técnicas de relaxamento, mas essa é simples e pode ser feita por qualquer um, não requerendo treinamento. Deite-se e foque sua atenção na musculatura do rosto. Note como ela está tensa. Relaxe ativamente essa musculatura. Em seguida, observe os músculos do pescoço e relaxe todos eles. Observe os músculos dos ombros e, assim sucessivamente, vá para os braços, tórax, abdome, quadril, coxas, pernas e pés. Não é raro que, ao chegar aos pés, os músculos do segmento superior do corpo estejam tensos novamente. Faça o caminho inverso e concentre-se novamente nas pernas, coxas, quadril, abdome até chegar à cabeça. Geralmente, ao chegar à cabeça, já começamos a sentir sono.
Para aquelas pessoas mais tensas, pode ser necessária uma técnica mais elaborada: a meditação do mantra. Apesar do nome, não precisa haver nenhum componente religioso nela. Procure um local tranquilo, silencioso e com iluminação suave (é sempre bom ter um abajur em casa), de preferência que não seja sua cama. Sente-se com a coluna ereta, podendo apoiar as costas se quiser. Respire mais profunda e lentamente algumas vezes, sentindo o movimento do ar em seus pulmões. Repita mais umas cinco vezes, sendo que, nestas últimas, segure o ar inspirado o máximo de tempo que puder, soltando-o livremente em seguida.
Agora você deve escolher uma sílaba que preferir, por exemplo “OM”. Comece por repetí-la lentamente (em voz alta ou mentalmente), prolongando os sons. Vá relaxando das pontas dos pés à cabeça. Quando sentir que está relaxado, levante-se lentamente e deite.
A imensa maioria das pessoas que têm dificuldade para dormir se beneficiam dessas técnicas e podem conseguir dormir sem a necessidade de apelar para o uso de medicações. Porém, se você não conseguir, procure um médico, não para pedir uma medicação para dormir, mas para descobrir a causa da sua insônia. Ela pode ser sintoma de doenças mais sérias, cujo diagnóstico precoce levará não só à melhora da insônia, mas ao tratamento da causa.