Indignação Seletiva – Quando a esquerda ignorou os cortes de direitos trabalhistas

Com o afastamento de Dilma e o governo interino de Michel Temer, a esquerda acordou repentinamente para a crise, lembrou que há desemprego e de imediato ligou sua máquina de difamação. Rapidamente surgiram os boatos sobre Temer querer cortar os direitos trabalhistas, alegando que o presidente em exercício pretende dar fim à CLT. Sem entrar no mérito da questão, venho aqui apresentar aos leitores como foi que ocorreram os cortes nos direitos trabalhistas praticados pelo governo de Dilma, logo na transição entre seu primeiro e segundo mandatos, e de que modo a esquerda reagiu a isso na época.

Que tal lembrarmos do período entre dezembro de 2014 e janeiro de 2015, logo após a reeleição de Dilma Rousseff, quando ela estabeleceu um corte de R$ 18 bilhões na Previdência?  Em uma só canetada, o governo federal cortou ou dificultou o acesso a benefícios para os trabalhadores brasileiros, os mesmos que dizia defender. As Medidas Provisórias 664 e 665, de 2014, visaram um corte de gastos do governo devido a má condução econômica do primeiro mandato de Dilma, que foi co-responsável por uma crise que já vinha sendo anunciada e solenemente ignorada pelo PT.

O contexto, entretanto, é o que mais importa. Os petistas vinham acusando a oposição (PSDB) de querer cortar os direitos trabalhistas. Fizeram isso durante toda a campanha eleitoral de 2014, e a própria Dilma chegou a dizer isso em debates na televisão. O partido basicamente fez disso uma peça de propaganda, e em uma entrevista (que você pode conferir no vídeo logo abaixo) a então presidente prometia não mexer em direitos trabalhistas “nem que a vaca tussa”. A motivação por trás dessas mudanças relativamente drásticas foi pura e simplesmente a necessidade de cobrir um rombo bilionário nas finanças da União, cujas contas foram rejeitadas meses depois pelo Tribunal de Contas da União, por decisão unânime. Vale ressaltar que boa parte deste rombo deve-se, também, aos desvios multi-bilionários praticados pelo governo e seus cupinchas.

Ou seja, o PT intencionalmente mentiu em campanha eleitoral e acusou seu adversário de algo que ele próprio veio a fazer, meses depois, e tudo com o claro intuito de proteger a si mesmo. Logo, mesmo que Temer realmente tenha a intenção de cortar direitos trabalhistas, com certeza não é um partido como o PT que possui alguma moral para criticá-lo por isso.

E que tal lembrarmos de como foi o posicionamento da CUT, da UNE e dos diversos sub-partidos de esquerda como PCdoB, diante de tais cortes?

A CUT, Central Única dos Trabalhadores, apoiou o governo de Dilma antes, durante e depois dessas medidas. Não foi por acaso que no ano de 2015 muitos sindicatos se desfiliaram da CUT, fazendo com que a entidade tivesse uma perda de representatividade, caindo de 38% para 32,6% dos trabalhadores brasileiros em poucos meses.

Entrei no site da UNE, na esperança de encontrar algum tipo de postagem ou evento passado realizado contra esta ação de Dilma. Não encontrei nada. Como nem mesmo um site decentemente organizado esses “estudantes” conseguem fazer, considerei a possibilidade de o sistema de buscas dele simplesmente não funcionar, então apelei para o Google e… Nada. As únicas referências encontradas sobre a UNE são sempre em apoio ao governo de Dilma, jamais contra ele.

O PSOL, justiça seja feita, publicou algumas notas criticando a medida, mostrando-se contrário aos cortes. No entanto, foi uma crítica meramente pontual, pois o partido continuou apoiando o PT até os dias atuais, tendo sido contrário ao impeachment de Dilma. Se o PSOL, ciente de que o governo cometeu estelionato eleitoral e que enganou os trabalhadores pelos quais diz lutar, mesmo assim preferiu ficar ao lado destes governantes, certamente é porque, para eles, o projeto de poder socialista está acima de qualquer “direito” ou mesmo da coerência entre discurso e prática. É de uma imensa hipocrisia publicar notas de repúdio ao mesmo tempo em que dá todo o apoio político necessário para o PT. Não há lógica alguma nesse tipo de coisa, senão aquela da picaretagem política pura e simples. Abaixo, segue um trecho da nota encontrada no site do PSOL-SP.

“Com isso, Dilma demonstra que seu governo, longe do que foi proclamado por ela no segundo turno das eleições, será marcado por mais arrocho e menos direitos para os mais pobres e aqueles que vivem do seu trabalho.”

Note, caro leitor, que o PSOL admite que Dilma cometeu crime eleitoral. O partido é perfeitamente ciente de que a presidente mentiu em campanha para se reeleger. Assim mesmo, seus integrantes continuam a apoiá-la.

E o PCdoB?

Bem, o PCdoB fez o que faz de melhor, criticou as medidas do governo Dilma sem atacá-la ou criticá-la de forma alguma. E pior, ainda tentaram tirar a responsabilidade da presidente, tratando o caso como se fosse “culpa do sistema capitalista”. Este é um caso em que a hipocrisia já virou cinismo. Em texto publicado no dia 2 de janeiro de 2015, o site do partido chegou ao cúmulo de tentar responsabilizar a oposição “conservadora” do Congresso. Curiosamente, foi a oposição quem se opôs aos cortes, enquanto os governistas apoiaram a medida. O DEM, por exemplo, defendeu na época que o ajuste fiscal deveria partir do próprio governo, através de menos dinheiro desperdiçado com regalias e repasses para empresários amigos do PT. Quem apoiou a medida foi, sem nenhuma dúvida, a própria base do governo de Dilma Rousseff.

O PCdoB seguiu desde então na aba do PT, fazendo toda sorte de coisas absurdas para defendê-lo. Flávio Dino, atual governador do Maranhão, deixou claro que a esquerda deve apoiar Dilma incondicionalmente – o que inclui, no caso, apoiá-la mesmo quando ela mentir, roubar, fizer conluios com empresários milionários, etc. Jandira Feghali, por sua vez, defendeu Dilma e Lula de todas as maneiras que pode. No processo de Impeachment, tanto na Câmara quanto no Senado, a orientação do partido é votar a favor de Dilma, e Flávio Dino teria, inclusive, participado de reunião com Waldir Maranhão antes de ele fazer seu showzinho como presidente interino da Câmara dos Deputados, quando tentou barrar o impeachment de Dilma através de um truque fajuto. Em tempo, sempre é útil lembrar que Waldir é do PP, um partido que a própria esquerda aponta como “reacionário”, e que o mesmo é investigado por diversos crimes.

Vendo tudo isso, você deve se perguntar como podem estas pessoas serem tão canalhas a ponto de fingirem lutar pelos “direitos trabalhistas”, apontando que seus opositores querem acabar com esses ditos direitos, sendo que eles próprios não se opuseram às medidas de Dilma. Porém, não é difícil entender. A verdade é que a esquerda em geral não liga para esse tipo de coisa, até porque se eles realmente se importassem com o trabalhador lutariam por liberdade econômica, não por aumento de impostos (algo que prejudica os trabalhadores). A verdade é que essas bandeiras só servem para o propósito de cumprir as agendas de seus movimentos e partidos, e estas agendas, de modo geral, visam poder e controle. É a engenharia social aplicada.

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